Doenças da tireoide e Glifosato. Qual é a relação?

O aumento da incidência de doenças da tireoide levanta uma série de questionamentos sobre quais são os principais fatores predisponentes na atualidade. Se a restrição alimentar de iodo já foi um grande problema de saúde global, hoje os processos de industrialização dos alimentos e a alta exposição a uma ampla variedade de produtos químicos ambientais podem estar afetando, direta ou indiretamente, a função tireoidiana.

O glifosato é um herbicida pós-emergente muito eficaz, não seletivo, usado para controlar ervas daninhas nocivas para vários cultivos. O glifosato tem sido associado a várias doenças, incluindo distúrbios da tireoide. No entanto, as agências reguladoras não encontraram nenhuma evidência para classificar o glifosato como um desregulador endócrino ou agente cancerígeno. Apesar disso, existem evidências entre a exposição ao glifosato e a incidência de linfoma não-Hodgkin, e a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC/OMS) classificou-o como “provavelmente carcinogênico para humanos” (Grupo 2A).

Em humanos, três estudos avaliaram a exposição ocupacional a pesticidas e sugeriram que o GBH (herbicidas à base de glifosato) pode estar envolvido na disfunção tireoidiana. Kongtip et al. observaram níveis mais elevados de TSH, T3 e T4 em agricultores convencionais, em comparação aos orgânicos, enquanto o glifosato foi o composto mais utilizado, seguido pelo paraquat e ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D). No Brasil, pesquisadores avaliaram os níveis de T3, T4 e TSH em produtores de soja que usavam agrotóxicos, incluindo glifosato, e encontraram uma diminuição significativa no TSH e um aumento no T3 e T4. Outro estudo avaliou a associação entre o uso de agrotóxicos, incluindo glifosato, e a incidência de hipotireoidismo em aplicadores, em um período de 20 anos, e constatou que o risco de hipotireoidismo aumentou significativamente devido ao contato com essas substâncias.

Segundo uma revisão ( 2021), existem pontos que estão bem claros em relação ao assunto:
● A regulação do eixo HPT é muito complexa, com várias etapas que podem ser afetadas pelos xenobióticos.

● O glifosato altera a absorção de selênio, o funcionamento dos canais de Ca++, e interrompe a fosforilação oxidativa, podendo afetar a função tireoidiana.

● O estresse oxidativo está presente na tireoidite autoimune e nos carcinomas da tireoide.

● O eixo HPT é reconhecido como o alvo dos EDCs.

● As formulações comerciais (GBH) são mais tóxicas que o glifosato.

● Poucos estudos de toxicologia tireoidiana foram realizados até o momento.

● Em testes validados por órgãos reguladores, as alterações tireoidianas apresentadas são desconsideradas, uma vez que é observada regulação alostática.

● O glifosato é detectado na urina de residentes de ambientes rurais e urbanos.

● Há uma correlação entre a exposição dos agricultores a GBHs e níveis alterados de hormônio da tireoide ou incidência de patologias da tireoide.
Conclui-se que poucos estudos avaliam os mecanismos de toxicidade (onde, como e se ocorre), o que torna frágil a extrapolação das correlações entre exposição humana e toxicidade, e que pode ser o momento de se começar a considerar o teste de toxicidade de formulações comerciais, pois elas representam a exposição humana e ambiental real.

Referência:
Romano RM, de Oliveira JM, de Oliveira VM, de Oliveira IM, Torres YR, Bargi-Souza P, Martino Andrade AJ, Romano MA. Could Glyphosate and Glyphosate-Based Herbicides Be Associated With Increased Thyroid Diseases Worldwide? Front Endocrinol (Lausanne). 2021 Mar 19;12:627167. doi: 10.3389/fendo.2021.627167. PMID: 33815286; PMCID: PMC8018287.